Autor: edit_kalinka
Ivan Turguêniev
Quando se pensa em literatura russa, Ivan Turguêniev (1818–1883) é daqueles autores inescapáveis. Suas obras, escritas com primor, tornaram-se conhecidas no mundo inteiro, tal como Pais e filhos (1862), dedicada ao crítico Vissarion Belínski.
De uma família nobre abastada, Turguêniev passou anos de sua vida na Europa, mas nunca deixou de se sensibilizar com as questões da Rússia. O interesse pelas transformações político-sociais de seu país não o impediu, no entanto, de expor em seus livros, que oscilavam entre romantismo e realismo, grandes contradições humanas.
Nascido numa propriedade rural na região de Oriol, tinha um pai ausente, que morreu aos 42 anos, e uma mãe voluntariosa e autoritária, Varvara Turguênieva. Em 1833, o futuro escritor ingressou no departamento de letras da Universidade de Moscou e, um ano depois, transferiu-se para a Universidade de São Petersburgo, onde se graduou em 1837, partindo para Berlim para continuar os estudos. A Alemanha foi também palco do encontro que teve com Mikhail Bakúnin, no começo da década de 1840, figura que em parte inspirou seu primeiro romance, Rúdin, de 1856.
A vida de Ivan Turguêniev sofreu uma guinada em 1843, quando ele conheceu em São Petersburgo a cantora lírica e compositora francesa Pauline Viardot e por ela se apaixonou perdidamente. Era casada com o crítico e diretor de teatro Louis Viardot, vinte anos mais velho, mas isso não conteve Turguêniev, que não mais se afastou de sua amada. A devoção por Pauline motivou nova temporada na Europa, onde ele manteve contato com grandes nomes das letras francesas, como George Sand, Gustave Flaubert e Victor Hugo.
Desde os anos 1830, o jovem Turguêniev, fanático por Púchkin e Gógol, traduzia e escrevia poemas e peças, mas sua entrada definitiva no mundo literário se deu em 1847, quando começou a publicar, na revista O contemporâneo, os contos que formariam o volume Memórias de um caçador (1852), coletânea que colaborou para o fim do regime de servidão da gleba. A partir de então escreveu principalmente textos em prosa, muitos dos quais se tornaram clássicos, tais como: Diário de um homem supérfluo (1850), Ássia (1858), Primeiro amor (1860).
Ivan Turguêniev morreu em 1883 em Paris, mas pediu que fosse enterrado em São Petersburgo.
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Lídia Tchárskaia
O nome de Lídia Tchárskaia (pseudônimo de Lídia Tchirilova,1875–1937), nascida em Tsárskoie Seló (São Petersburgo), hoje nem na Rússia é amplamente conhecido, mas ela foi a autora infantojuvenil mais lida no início do século XX.
A mãe de Lídia morreu no parto e seu pai era militar. Quando completou 10 anos de idade, por conflitos com a nova família do pai, foi mandada para o Instituto Pávlovski, um internato para moças, onde ficou até os 17 anos. Ao sair, ingressou na Escola de Teatro Imperial de São Petersburgo e, em 1898, tonou-se parte do corpo de atores do Teatro Aleksandrínski, fazendo pequenos papéis. Depois de separar-se do marido, Lídia começou a escrever para ajudar no sustento do filho e adotou o pseudônimo Tchárskaia (de tcháry, “feitiço”, “encanto”).
Com mais de 80 obras publicadas (em geral infantojuvenis), a autora enveredou por vários gêneros literários: escreveu poemas, contos, contos maravilhosos, novelas, romances autobiográficos e históricos. Suas protagonistas femininas — românticas, sentimentais, positivas e não raro órfãs (como a própria autora) — causavam sensação entre russinhas adolescentes.
Memórias de uma moça no internato (1901–1902), sua primeira novela, foi publicada na revista Palavra sincera e fez sucesso espantoso. Baseada nas lembranças do Instituto Pávlovski, a autora retrata os conflitos e as expectativas de moças cheias de paixão. As protagonistas, a pobre ucraniana Liuda Vlássovskaia e a princesa georgiana Nina Djavakha, deram origem a uma série de livros, que inclui A princesa Djavakha (1903), Liuda Vlássovskaia (1904), A segunda Nina (1907), entre outros. A livre e exótica Djavakha, a quem MarinaTsvetáieva chegou a dedicar um poema na coletânea Álbum da tarde (1910), foi a heroína mais adorada entre as criações de Tchárskaia.
Com a Revolução de 1917 e a instauração de um novo regime, os livros de Lídia Tchárskaia, assim como os de outros autores, foram retirados das bibliotecas e deixaram de ser editados: “elеs eram estranhos à classe proletária e não correspondiam à nova ideologia”, sendo considerados por demais sentimentais e “burgueses”. Ela conseguiu driblar a censura por um tempo, usando um pseudônimo, mas, após ser descoberta, não teve como continuar escrevendo. Foi despedida do teatro em 1924. Kornei Tchukóvski, Samuel Marchak e Víktor Chklóvski, representantes de uma nova proposta estética, criticaram-na publicamente — o único que saiu em sua defesa foi Fiódor Sologub, elogiando a escrita e a popularidade da autora, que acabou morrendo no ostracismo e na pobreza.
Com o fim da União Soviética, as obras de Tchárskaia voltaram a ser publicadas, embora sem o mesmo frenesi.
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Vladímir Odóievski
O príncipe Vladímir Odóievski (1804–1869) era musicólogo, escritor e ocultista. Foi representante do romantismo russo, com influências de Hoffmann, Schelling (a quem conheceu pessoalmente) e do idealismo alemão. Odóievski publicou em 1844 Noites russas, romance de traços românticos e filosóficos.
Como músico e musicólogo, acreditava que a “música era filha da matemática”, admirava Bach, Beethoven e Glinka, compôs músicas sobre poemas de Púchkin e Nekrássov e para fábulas de Krylóv. Foi autor dos livros Alfabeto musical para escolas populares e Gramática musical para não músicos.
Participava ativamente da vida literária, era amigo de Gógol e Lêrmontov, e sua obra interessou a Púchkin, de quem foi ajudante na revista que o poeta havia fundado, O contemporâneo. Foi Odóievski, por sinal, o autor da frase “o sol da poesia russa” — referindo-se a Púchkin —, que é repetida aos quatros ventos na Rússia. O príncipe também se interessou pela educação; ele acreditava que as crianças deveriam desenvolver qualidades humanitárias e valorizar o saber por um processo de aprendizagem não desquitado da realidade e concebido como um todo, e não como um conjunto de disciplinas isoladas e artificiais.
Vladímir Odóievski começou a escrever textos para a infância nos anos 1830, com o pseudônimo titio Irinei, e passou por vários gêneros.
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Nikolai Leskóv
De origem humilde, Nikolai Leskóv (1831–1895), o mais velho de sete irmãos, teve vários trabalhos antes de dedicar-se, nos anos1860, ao jornalismo e à literatura. As viagens comerciais que fez pela Rússia em 1857, ao trabalhar com um tio de sua esposa, deram-lhe a oportunidade de conhecer variados tipos humanos, que foram retratados repetidamente em suas obras.
O posicionamento independente do escritor o fez colecionar polêmicas religiosas (chegou a virar tolstoísta) e políticas (ele se indispôs com conservadores e radicais) nas duas profissões que tinha, que na verdade coincidiam de certa forma.
Deixou romances, como A lugar nenhum (1864), novelas, como Lady Macbeth do distrito de Mtzensk (1865), e muitos contos, como “O canhoto“ (1881), que, entre realidade e ficção, retratam camponeses, religiosos, comerciantes, loucos e tratantes, sempre com uma linguagem saborosa e variegada que usa da sátira e da estrutura dos contos populares russos.
Parа crianças, publicou na década de 1880 a coletânea Contos de Natal (1886) e textos nas revistas Palavra sincera e Brinquedinho, como “A cabra” e “O espantalho”.
O nome de Léskov também se tornou conhecido por um ensaio de Walter Benjamin sobre o narrador, de 1936, que circulou nos meios acadêmicos e no qual é acentuada a oralidade de sua narrativa.
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Catarina II
Leitora aplicada, Catarina II (1729–1796), a imperatriz da Rússia entre 1762 e 1796, além de trocar correspondências com pensadores célebres, aventurou-se na escrita. Os primeiros contos russos para infância saíram da pena da tsarina.
Catarina nasceu Sophie Friederike Auguste, na antiga Prússia, e, ao casar-se com o futuro Pedro III e converter-se à fé ortodoxa, adotou o nome russo.
Nos 34 anos de seu governo, ela aprofundou o processo de ocidentalização iniciado por Pedro, o Grande, e promoveu as ciências e as artes. Foi sua coleção particular, incluindo 13 quadros de Rembrandt e 11 de Rubens, que deu origem ao acervo do Museu Hermitage; em 1764, graças a seu empenho, foi inaugurado o Instituto Smólny para moças nobres, a primeira instituição educacional para mulheres da Rússia; também foram criados, com seu incentivo, arquivos, tipografias, bibliotecas.
Mesmo com os avanços culturais e algumas ideias progressistas, seu reino foi marcado pelos privilégios que cedera aos nobres e pela falta de liberdade e de direitos dos camponeses, a maior parte da população. Não por acaso Emelian Pugatchóv (c. 1742–1775) comandou um levante camponês em 1773/1774, acontecimento descrito na novela A filha do capitão (1836), de Aleksándr Púchkin.
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Vera Ermoláieva
A pintora, ilustradora e pedagoga Vera Ermoláieva nasceu em 1893 na província de Sarátov. Quando pequena, sofreu uma queda de um cavalo que a deixou com as pernas paralisadas. Concluiu o ginásio em São Petersburgo. Em 1914 passou uma temporada na Europa, interessada por artistas como Cézanne, Picasso e Braque.
De volta à Rússia, entre outras atividades, organizou o coletivo Hoje (1918), que produziu livros infantis futuristas e com base na cultura popular russa (lubók). Foi discípula e colaboradora de Malévitch e fez parte do grupo UNOVIS (Consolidadores da nova arte), um laboratório suprematista.
Figura ativa da vanguarda russa, ela trabalhou também nas melhores revistas infantojuvenis soviéticas e ilustrou livros de muitos autores, além dos seus próprios. Em seus trabalhos usou linguagens diferentes, trouxe elementos do fauvismo, cubismo, construtivismo.
Em 1934, acusada de propagar ideias antissoviéticas em arte, acabou presa, com membros do grupo “realismo pictórico-escultural”, seguidores de Malévitch. Morreu fuzilada em 1937 em um campo de prisioneiros. Em 2013, foi criada em Moscou a Fundação Vera Ermoláieva, para iniciativas de artistas contemporâneas.
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Friedrich Gorenstein
Friedrich Gorenstein (1932-2002), nascido na URSS, é autor de contos, romances, roteiros e peças de teatro, como Uma discussão com Dostoiévski (1973). Com Andrei Tarkóvski, assinou os roteiros dos filmes Andrei Rublióv (1966) e Solaris (1972), além de A escrava do amor (1976), de Nikita Mikhalkóv. Autor de dezesseis romances, Gorenstein foi finalista do prêmio Booker Prize (Rússia) em 1992.
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Leonid Dobýtchin
No fim de 1987, um pouco depois de voltar de Estocolmo, onde fora receber o Nobel de literatura, Joseph Brodsky falava a um grupo de estudantes e professores da Universidade de Harvard. O escritor Arkádi Lvóv lembra o episódio no jornal:
— Qual dos escritores…
Brodsky nem terminou de ouvir a pergunta:
— Minha altivez é a poesia.
— Mesmo assim, quem o senhor considera o maior escritor russo pós-revolucionário?
Brodsky refletiu. Ouviam-se vozes de todos os lados:
— Bulgákov, Platónov, Bábel, Zóschenko…
— Dobýtchin — proferiu Brodsky rapidamente. — Leonid Dobýtchin.
(Extraído de um artigo de V. Mechkóv, publicado em Gazeta da Cidade, Eupatória, Ucrânia, ago–out, 2007, nº 29–39)
O nome de Leonid Dobýtchin (1894–1936), hoje aclamado por literatos russos, foi redescoberto depois de 1990. Dobýtchin enfrentou uma vida repleta de dificuldades. Trabalhou como estatístico em regiões do norte da Rússia, dividindo quartos de solteiro com a mãe, uma parteira, e três irmãos. Viveu os últimos anos de sua vida em Leningrado (atual São Petersburgo). A morte do escritor, em 1936, provável suicídio, ocorreu no momento em que Stálin declarou guerra contra o formalismo. Ser tachado de formalista e politicamente míope, como Dobýtchin o foi após a publicação da novela A Cidade Ene (1935), era na época uma acusação gravíssima. Ele defendeu-se dela numa reunião na União dos Escritores de Leningrado e desapareceu no dia seguinte. Em vida, além da novela, publicou duas coletâneas de contos, Encontros com Liz (1927) e O retrato (1931) — reunidas em Encontros com Liz e outras histórias (ed. Kalinka, 2009). Escreveu ainda Os selvagens (1989) e O clã do Churka (1993), este que recebeu o prêmio “Internacional Book of the Year” do Times Literary Supplement de 1994.
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Viatchesláv Kupriyánov
O poeta Viatchesláv Kupriyánov (1939) nasceu em Novosibirsk, na Sibéria, e mora há muitos anos em Moscou, onde se formou nos anos de 1960 no Instituto de Línguas Estrangerias (no começo da carreira traduziu textos do alemão, sobretudo de Rainer Maria Rilke).
Com muitas antologias publicadas e prêmios recebidos, Kurpriyánov é estudado e apreciado em vários países do mundo, como na Alemanha, onde ele possui um percurso notável. Além disso, é um artista muito ativo. Em 1988, por exemplo, organizou o primeiro festival de poetas independentes da Sibéria.
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Fiódor Sologub
Fiódor Sologub (1963–1927) foi um dos nomes mais representativos do simbolismo russo, que floresceu no início do século XX. Às vésperas das revoluções de 1905 e 1917, o momento simbolista, no qual o apuro na linguagem se fez tão presente em construções sapientemente elaboradas como às da escrita de Sologub, preparou o advento de novos caminhos estéticos na arte russa.
Fiódor Sologub, pseudônimo de Fiódor Kuzmitch Tetiérnikov, nasceu no ano de 1863, em São Petersburgo. Perdeu o pai, um alfaiate, aos quatro anos de idade. Sua mãe, severa e religiosa, depois da morte do marido, tornou-se criada na casa dos Agápov, onde o menino Fedia Tetiérnikov e sua irmã mais nova, Olga, passaram a infância e a juventude. Ao concluir o Instituto Técnico de São Petersburgo, ele trabalhou como professor de matemática e depois como inspetor escolar até o ano de 1907.
A obra de Sologub começou a ser publicada em almanaques na década de 1880, mas foi o ano de 1896 que marcou o início de sua carreira, quando três de seus livros foram publicados: Poemas; Sombras: Contos e Versos; e o romance Sonhos maus.
A figura estranha e esquiva de Fiódor Sologub tornou-se lendária entre os simbolistas. Muitos escritores e poetas teceram palavras calorosas e exultantes sobre sua obra, como Andrei Biély (1880–1934) e Evguéni Zamiátin (1884–1937), embora invariavelmente descrevessem o autor como um homem de poucas palavras e ausente, sempre com o pincenê, as pernas cruzadas e os olhos entreabertos.
A morte trágica de sua esposa e colaboradora, a ensaísta e escritora Anastácia Nikoláievna Tchebotariévskaia (1876–1921), que se jogou da ponte Tutchkóv ao rio Nevá, marcou os últimos anos do escritor. Sologub continuou a produzir até o ano de 1923 (o ano de sua última publicação).
Teve uma vasta carreira literária. Escreveu romances — como Sonhos maus, A lenda criada e sua mais afamada obra em prosa, O Diabo Mesquinho, também adaptado ao teatro –, inúmeros poemas, ensaios, contos, contos maravilhosos e peças de teatro. Suas Obras reunidas publicadas em Petersburgo pela Editora Sirin (1913–1914) constituem vinte volumes, que foram ainda complementados com seus escritos posteriores.
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